quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Preços no Brasil: imposto+margem ou tem outros fatores???

Tenho visto alguns comentários, posts e textos sobre os preços no Brasil, que realmente são abusivos, extremamente superiores a praticados em outros países. Esta é uma situação que terá conseqüências graves em um breve futuro.

Porém a análise não é tão simples como colocam em alguns desses comentários. É real que o Brasil tem uma carga tributária imensa e que as margens dos produtos são enormes, mas só isso não explica os preços por aqui.

O grande problema do Brasil é a falta de eficiência.



Tenho certeza que você já ouviu falar do custo Brasil. Este custo é composto, além de impostos, por ineficiências, restrições, péssimas condições de operação empresarial, juros e ainda por uma cultura de rápido retorno.
Tanto impostos abusivos como margens de lucro altas são conseqüências de outros fatores. É um texto de forma geral desta questão no Brasil, mas em alguns pontos vou focar o mercado de vinhos importados. Vamos às principais:

Impostos:
A carga tributária sobre o PIB no Brasil é em torno de 35%. 12 pontos percentuais acima da Argentina (quase 50% maior) e 7 pontos acima dos EUA (25% maior).
Quando falamos de carga tributária, não só de ICMS, IPI e Cofins tratamos. Inclua-se ai IPTU, IPVA, enfim uma série de impostos que não estão ligadas à operação da empresa, mas que compõe sua base de custo.
E outro complicador que não se menciona muito é a complexidade das leis. As empresas precisam manter departamentos inteiros ou contratar empresas especializadas para cumprir integralmente com a legislação fiscal e outras burocracias. Uma empresa de pequeno porte dificilmente tem condições de cumprir com toda essa legislação e ai abre-se uma porta para a corrupção.

Corrupção:
Temos um governo corrupto que precisa de burocracia e leis complicadas para manter essa corrupção. Se o governo já é sócio do nosso negócio com os impostos, a corrupção faz com que os fiscais do governo também fiquem sócios.
Vocês devem imaginar o que é desembaraçar um container no porto. Muitas vezes o produto fica retido por meses no porto esperando uma solução burocrática. E ainda complicam mais, incluindo o tal selo no vinho. O capital empatado e a operação logística com mais operações vai encarecendo o produto ali parado no porto.

Custo do Capital:
A taxa básica da economia está em 10,5% ao ano, levando os juros reais para 4,9% (descontando a inflação). Agora se o empresário brasileiro tivesse acesso a crédito nesse patamar de taxa de juros estaríamos no céu.
O custo do capital está em torno de 30% ao ano. Adicione-se a isso a dificuldade em obter crédito.
Imagine novamente na situação acima para a liberação do container no porto, o impacto do custo do capital no preço da mercadoria.

Custo da folha de pagamento:
Além dos impostos incidentes sobre o produto e sua movimentação, também outro custo torna a operação brasileira entre as mais caras do mundo. Enquanto nos EUA, os encargos sobre a folha de pagamento giram em torno de 6 a 7%, no Brasil chega a ser de 80% (sem contar benefícios extras que as empresas oferecem).
Eu sou do mercado de tecnologia da informação e sei o quão pouco competitivo somos no mercado mundial de desenvolvimento de software devido principalmente ao custo da mão de obra por aqui.

Infra-estrutura:
O Brasil está muito, mas muito atrasado neste quesito. Falo da infra-estrutura de toda ordem: logística, telecomunicações, energia, educação.... entre outras.

Logística: dependemos de um único modal interno: rodoviário, que não é a de menor custo. Também é a de menor segurança, mais suscetível a assaltos. Devido a esta falta de segurança, as empresas são obrigadas a ter sua própria esquema de segurança. Mais custo!
Portos ruins de operação deficiente e estrutura atrasada, estradas de péssima qualidade ou quando não com alto custo de pedágios, o pior combustível do mundo (nossa gasolina ou diesel é umas das mais ineficientes). De novo, vários fatores que geram custo e ineficiência.

Telecomunicações e energia: é das mais caras do mundo. O Brasil precisou dar um salto de qualidade nos anos 90, estávamos muito defasados do mundo. Foram pesados investimentos que estamos pagando a conta ainda.
Conheço várias empresas que deixam de manter operação fabril no Brasil devido a estes custos. Um exemplo é a indústria de papel (por um lado felizmente não instalam outras unidades aqui, pois é um setor muito poluidor) que é intensivo em energia elétrica.

Educação: o brasileiro é um dos melhores profissionais que já vi no mundo, porém somos muito mal formados. Péssimas escolas de base e uma enxurrada de faculdades e universidades sem a menor condição de formação adequada de mão de obra qualificada. A universidade pública, que é de boa qualidade, acaba recebendo os alunos das melhores escolas secundárias, portanto as pagas. Mesmo o 2º grau que poderia formar técnicos, são raros os casos de escolas que formam adequadamente. Portanto acabamos por ter uma mão de obra não tão eficiente, que apesar de todo o esforço, criatividde do profissional brasileiro.

Ineficiência de gastos do governo:
Pode parecer retórica, mas o fato de pagarmos altos impostos e não termos em retorno de serviços eficientes de saúde, educação, moradia, traz mais custo para as empresas. Ela acaba tendo que ocupar esta falha do governo. Os gastos com programas sociais têm que dar o segundo passo: primeiro trouxe o peixe, agora precisa ensinar a pescar. Isto quer dizer, formar melhor mão de obra e gerar condições de aumentar o emprego.
Além da ineficiência de serviços para a população, a falta de investimentos na infra-estrutura causa problemas que podem gerar um apagão neste país, um apagão logístico, de energia, de mão de obra... Muito preocupante.

Uma frágil estabilidade:
Tudo é recente neste país. A estabilização política ainda não tem 30 anos. Muitos dos políticos atuais que gravitam no poder ainda são da geração da ditadura militar. Como a transição não foi uma ruptura, foi negociada, a população teve uma participação parcial no processo, ainda existem resquícios da cultura política de outrora.
A estabilidade econômica é mais recente ainda. Ainda brigamos para evitar a inércia inflacionária. Apesar de o governo atual ter mantido a política econômica que gerou esta estabilidade, vemos alguns setores do próprio governo dar menos importância a uma estabilidade econômica impulsionando gastos de custeio que não trarão incentivo à economia.
Com toda esta incerteza, o empresário coloca no seu custo o risco Brasil!!



Concluindo, a alta carga de impostos é um dos causadores dos enormes preços no Brasil sim é. Mas o governo precisa manter esta carga para conseguir cumprir com o custeio da máquina que, por sua vez, não traz benefícios para a economia, portanto empresas, portanto aos empregados.



Por sua vez, os empresários colocam altas margens para 1) para compensar este custo Brasil e 2) para remunerar o alto risco de ser empreendedor no Brasil, pois ainda vivemos uma estabilidade muito frágil. Um empresário faz um investimento de porte médio para baixo buscando um retorno de capital entre 2 e 3 anos.



Então o que temos que mudar:


1) O governo precisa ser mais eficiente. A arrecadação com os impostos precisa retornar mais para a infra-estrutura para as empresas. Reduzir a burocracia.
2) Criar melhores condições de competição nas áreas de telecomunicações, energia e financeira. As empresas precisam baixar seus preços
3) Merece um item: o spread bancário precisa cair drasticamente. Necessitamos de mais competição no mercado financeiro, os bancos governamentais precisam exercer um papel mais decisivo aqui. O Banco Central precisa reduzir o depósito compulsório para aumentar a oferta de dinheiro e os bancos comerciais precisam ser menos gananciosos!!! Talvez a criação de uma agência reguladora poderia reduzir os ganhos dos bancos.
4) Melhorar a malha logística, desde portos, rodovias, aéreo (reduzir custos!!!) e incrementar muito a ferrovia.
5) O empresário precisa ter confiança no país e na estabilidade político-econômica e fazer investimentos de mais longo prazo. O retorno irá acontecer ao longo de dez, quinze, vinte anos.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Para começar a entender a Borgonha

Recentemente estive em uma palestra sobre vinhos da Borgonha, na qual foram degustados alguns exemplares únicos da região (nenhum deles é importado regularmente para o Brasil) e ao final um jantar com o famoso boeuf bourguignon.



Conhecer um pouco da Borgonha (sim, foi muito pouco já que a palestra foi de 3 horas) nos faz viajar à mais fanática tradição de produção de vinhos. Os borgonheses elevam o conceito de terroir à enésima potência, há uma obsessão por encontrar o melhor local para a melhor uva com a melhor forma de vinificação. Também percebi que lá há um embate da tradição da produção em pequenas escalas e propriedades familiares, com a força econômica da produção com tecnologia (e química...). Utilizam-se, por exemplo, técnicas biodinâmicas, não por adotá-las recentemente, mas na verdade por nunca as terem deixado de usar.

Enfim, foi uma introdução que deixou na boca o gostinho que motiva a entrar mais neste mundo da Borgonha. Espero que o Jean e Sonia façam outros módulos do curso com temas mais detalhados.

Os vinhos apresentados foram todos excelentes e surpreendentes. Desde os Chardonnays, passando pela incrível Pinot Noir e chegando à encorpada e carnuda Gamay ... SURPRESA!!... estranhou???





Esta (abaixo) foi a maior surpresa da noite: tomamos um Gamay de alto potência, com um corpo de fazer inveja. A Gamay, hoje com uma imagem muito desgastada devido aos vinhos de Beaujolais que chegam ao Brasil, foi a principal uva tinta da Borgonha há séculos atrás. O vinho que tomamos foi feita por uma técnica ancestral que mantém a fase de fermentação por mais 1 ou 2 semanas e matura (élevé) em carvalho por 4 anos, assim tirando o máximo da casca e “domando” o vinho nos tóneis. O resultado é um vinho potente, encorpado, complexo, redondo!! Apresento o Gamay de Futur do Chateau de Villars Fontaine.


Por fim, junto com o bouef, nada mais nada menos que um Grand Vin de Bourgogne, um Corton-Renardes Grand Cru da Domaine Marius Delarche.

Além dos participantes do curso, tive a oportunidade de conhecer a Sonia e o Jean que foram maravilhosos na organização e recepção. Proporcionaram um momento único e uma ótima entrada para o mundo da Borgonha.

Também não poderia deixar escapar a oportunidade para comentar um outro vinho que tomamos lá, uma colher de chá do Jean. Foi um vinho de garagem feito por Jean lá no Vale dos Vinhedos: Éléphant Rouge 2008 (acho que é a primeira safra do vinho), um Cabernet Sauvignon excelente, bem estruturado, ótimo corpo, boa complexidade.


Serviço da palestra:
Curso de vinhos da Borgonha
Conduzido por Jean Claude Cara
Realizado por Éléphant Rouge e Madame do Vinho (Sonia Denicol)
Local: La Régalade